novembro 21, 2006

[ ]



eu me lembro dele, era aquele tipo de cara que você tem que olhar duas vezes. calado, distante, as palavras saiam pelos olhos. e aquele olhar, ah, mas que olhar, perdi o fôlego e qualquer outra coisa que pensava que tinha. levava-me a um lugar diferente de todo o resto. abria a boca e saiam aqueles erres cheio de explicações e alucinações realistas. o frio percorrendo os ânimos. olhares furtivos e sorrisos nervosos. uma coisa quase automática. um delicioso vício corroendo os neurônios, despertando anseios.
olhos pretos, cabelos pretos e mãos de desenhista.
N.

4 AM

Vi o peixinho boiar na privada. Boiar e rodar. Mamãe dizia que não prestava. Dizia que morto não se deve olhar, deve deixar lá boiando e rodando, o dourado reluzindo nas paredes, saindo pela minha boca, pelos meus olhos. Lembro tão bem daquele dourado, era vivo, vivo e eu queria pegar, mas não pode colocar a mão, é sujo. Sujo, sujo, dizia. E o peixinho alisava-me o rosto e dizia pra fechar os olhos e tampar o ouvido. Não chora, não chora, vai passar, não olha, não sente. E o sulco formando na pele, pele vermelha igual a do peixinho. Não chora, não chora, vai passar, não chora. O peixinho rodando, rodando até sumir com a água, não chora, não chora criança, não sente.


N.